Notável que com o passar dos anos, o direito vem reformulando o conceito de “família”, tornando-o cada vez mais abrangente, valorizando o vínculo afetivo tanto quanto o biológico. Isso inclui claramente, o vínculo afetivo entre humanos e animais (pets), o que constituí aquilo que podemos chamar de “famílias multiespécies”. Afinal, para muitas pessoas, o seu animal de estimação é um membro da família.
O direito busca regularizar questões sociais de relevância, e atualmente o número de “famílias multiespécies” é elevado, caso que não poderia ser ignorado pelo Judiciário, que vem buscando soluções para eventuais litígios. E, por se tratar de uma matéria nova, da qual o direito brasileiro não tem uma lei específica, muitos questionamentos são feitos, como por exemplo: No caso de eventual divórcio, qual cônjuge ficaria com o pet? Haveria direito a guarda compartilhada no animal de estimação? Existe o dever de pagamento de alimentos em favor do pet (“pensão”)? De qual forma os Juízes vem decidindo sobre tais casos?
Bem, diante da ausência de Lei sobre a matéria e do aumento gradativo de lides envolvendo os pets, o Judiciário vem buscando julgar da melhor forma quando acionado, os magistrados se valem das regras que disciplinam a guarda de crianças, utilizando a analogia para suprimir a ausência normativa, procurando sempre dar decisões justas e coesas.
Visando sanar a lacuna normativa, recentemente foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 62/2019 de autoria do Deputado Fred Costa (Patriota/MG), que dispõe sobre a guarda dos animais de estimação casos de dissolução litigiosa da união estável hétero ou homoafetiva e do vínculo conjugal entre seus possuidores, e dá outras providências.
Até que se chegue à conclusão deste projeto, o Judiciário vem decidindo por analogia, aplicando ao caso dos pets o que a Lei prevê para as discussões sobre os filhos menores ou incapazes. No caso concreto, o Juiz avaliará, a partir das provas produzidas, quem possui melhores condições de acolher a guarda do pet, que poderá ser unilateral ou compartilhada, como também uma forma adequada para a realização do direito de visitas, de modo que se mantenha o vínculo de afeto entre o animal de estimação e a pessoa que, em virtude da separação, deixou de residir com ele. Como ocorre em relação aos filhos, o Judiciário tem felizmente se curvado no sentido de atender ao princípio do melhor interesse dos pets.
Outro posicionamento de suma importância, foi o dado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, através do Enunciado de número 11, que dispõe que: “na ação destinada a dissolver o casamento ou a união estável, pode o juiz disciplinar a custódia compartilhada do animal de estimação do casal”. A partir desses elementos, com o emprego da analogia, a doutrina e a jurisprudência tem cuidado de construir caminhos para a solução dos litígios a que a Lei ainda não deu resposta.
O que devemos ressaltar é que, mesmo sem nenhuma legislação especifica sobre a matéria, o Judiciário se mostra cada vez mais atento a atender as demandas de forma justa e conforme o bem-estar dos animais, principalmente pela aplicação da analogia com o Direito de Família, e pela determinação da guarda e visitas dos pets nos casos de eventuais dissoluções litigiosas da união estável, sendo essa hetero ou homoafetiva.
Diego Meneguelli Dias, graduado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, pós-graduado em Direito Processual Civil e pós-graduando em Direito Empresarial e em Direito de Família e Sucessões, é o sócio da Ferreira e Santos Advogados responsável pelas áreas de direito de família e sucessões, direito imobiliário e direito societário.
Fernanda Bezerra Linchin, graduada pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul, pós-graduada em Lei Geral de Proteção de Dados e pós-graduanda em Direito Digital e Planejamento Patrimonial, Familiar e Sucessório, é advogada da Ferreira e Santos Advogados nas áreas de direito de família e sucessões, direito imobiliário e direito societário.